Sim... estou cansada - por Camila Emerick

Sim... estou cansada - por Camila Emerick

Há momentos em que eu gostaria de ser só mãe. Ter rótulos de mãe. Problemas de mãe. Mas quando uma mãe atípica fala isso, ela escuta: “Você não aceitou seu filho”. 

Isso vai muito além da aceitação.

Quando na maternidade você recebe o diagnóstico, não há tempo para um puerpério como deveria, não há uma licença especial só para se adaptar ao bebê. É preciso adaptar-se a um bebê com deficiência e com demandas muito mais complexas, com preocupações que vão além da saúde, pois também precisamos lidar com preconceitos, com homens que somem (e a sociedade aceita isso) no período que a mulher precisava ainda mais de apoio... além das falas e comentários que sempre surgem em todos lados: “Será que essa mulher não estava velha para ser mãe?”, “Será que ela tomou algum medicamento?”, “Será que não bebeu?” “Ahhh... essa quis abortar... Deus deve ter punido ela.”. Aí vem a depressão, a tristeza.
 
Não se comparam vidas e vivências. Mas você que é só mãe e está cansada, já tentou imaginar por que sua colega mãe atípica – e muitas vezes mãe solo – está cansada também, mais do que você? Ela precisa ser só mãe... ser só mulher. Em vez de achar que ela não aceitou a deficiência do filho, por que você não oferece uma cerveja? Por que você não se disponibiliza para dormir com o filho dela para ela conseguir dormir uma noite inteira? Por que você não a acompanha em uma consulta apenas para segurar a sua mão? Por que você não liga para ouvir, conversar, falar umas besteiras e descontrair?

A sociedade precisa avançar muito, mas ela pode começar com você.

Com seu abraço. Com seu ombro. Com seu sorriso. Com sua mensagem. Sei que a vida da maioria das pessoas é uma correria sem fim. Mas será que duas horinhas em um mês, em uma semana, vão ser tão prejudiciais à sua rotina? Tenho certeza de que com essas horas você ganhará muito mais. Você conhecerá um mundo novo e sensacional. Você verá o brilho nos olhos dessa mãe com as conquistas do seu filho.  

Falo por experiência, é bom demais fazer parte desse mundo. Mas se eu tivesse uma varinha mágica seria só mãe. Não quero mudar meu filho e muito menos tirar a deficiência dele, mas gostaria de políticas públicas, gostaria que os planos de saúde não nos dessem tantas negativas, gostaria que os homens não fugissem após um diagnóstico, gostaria que as mulheres não fossem tão sobrecarregadas.
 
Sim, estou cansada... mas eu aceito meu filho do jeito que ele é!
Sim, estou cansada... mas eu amo meu filho!
Sim, estou cansada, tão cansada... eu só quero ser mãe do Bento!

 

 

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Camila Emerick, a mãe do Bento. Mãe atípica solo. Preta! É professora da rede municipal do Rio de Janeiro há 25 anos e atua com Educação Inclusiva. Faz parte do Projeto de Fotografia Documental InvisibiliDOWN - Ensaios sobre o Racismo e a síndrome de Down

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